Coluna: Tarcísio de Freitas declara “guerra” à ciência e ao ensino superior
A manifestação é contraditória e inconveniente. Contraditória porque, em primeiro lugar, o próprio Tarcísio é engenheiro formado pelo Instituto Militar de Engenharia. O filho dele, por sua vez, é estudante de engenharia de produção na UnB, uma universidade pública. No estado que governa, tanto a USP quanto a Unicamp são universidades públicas da mais alta qualidade, vinculadas ao governo de São Paulo. A Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) também é instituição pública, e todas elas dependem do orçamento estadual para continuarem exercendo suas atividades.
Inconveniente porque feita justamente faltando três dias para a segunda etapa do Enem, exame usado como critério de admissão em cursos de graduação que contou com mais de 4,8 milhões de brasileiros inscritos, somente nesta edição. Mas a ofensiva não se propaga apenas em oposição a essas 4,8 milhões de pessoas escaladas para as provas do último domingo. Ao insinuar a obsolescência do ensino superior, Tarcísio também se coloca no pólo oposto de toda uma superestrutura educacional já consolidada a nível nacional, formada por faculdades e universidades privadas que atendem milhões de estudantes e têm no Prouni e no Fies uma fonte considerável de sua receita.
Para bem além disso, ao expressar seu descontentamento com o nível superior, o governador de São Paulo se contrapõe a um projeto de nação independente e soberana do ponto de vista tecnológico. Os países desenvolvidos do mundo, com poucas exceções, possuem altas taxas de escolaridade e índices de aproveitamento elevados nas mais variadas áreas do conhecimento. China, Coreia do Sul e Vietnã atingiram recordes de crescimento por meio de investimentos em tecnologia, e tecnologia não pode ser criada a partir de um povo sem instrução.
Caso se tratasse de uma objeção dispersa, talvez ela pudesse ser ignorada. A realidade, todavia, é que Tarcísio de Freitas declarou guerra contra a educação e também contra a ciência, ao sancionar, no dia 3 de novembro, uma lei que desmonta a categoria de pesquisador científico no Estado de São Paulo. Segundo a Associação de Pesquisadores Científicos do Estado (APqC), a medida foi realizada sem diálogo com os profissionais e "representa um ataque direto à pesquisa pública paulista, construída ao longo de décadas com base em uma carreira sólida, transparente e de mérito técnico." A Associação já se comprometeu a entrar na Justiça contra a medida do governador.
Tarcísio tem sido apontado pela mídia como possível candidato a Presidente da República. Com suas palavras e ações, já demonstrou que não tem compromisso com a geração de conhecimento, nem com o desenvolvimento intelectual do país. O notório exterminador da coisa pública já privatizou a água e o abastecimento da região metropolitana de São Paulo, bem como liquidou a empresa estadual de transporte urbano. Resta saber o que mais pretende obliterar.



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